quarta-feira, 20 de novembro de 2013

muriçocas(um e outro) (18/11/13)

poderíamos ter ido juntos ao sítio do teu avô
e ao mirante no porto, ver a cidade e seus meninos
ver a cor da areia de pedras
ver os olhos um do outro

poderíamos ter plantado sementes de ipês brancos
no quintal do presidente da República
e ter criado os ipês brancos
e ter matado os ipês brancos de esquecê-los
vendo os olhos um do outro
nos meses de os aguar

poderíamos ter bebido dos cálices de nossos pais
e de prazeres, e de palavras
e da chuva que tanto tempo vimos
enquanto soubemos um do outro

poderíamos ter andado trilhas cheias de palhas de tecer colares
ter tecido nós mesmos os nossos artefatos de plantas
usando a medida dos corpos um do outro

e, nas noites muito quentes de se dormir,
poderíamos ter ido ao telhado da tua casa
embicar-nos no frio do concreto e como os leões da savana
fazer sombra um no outro

mas em vez de tudo isso estivemos matando as muriçocas
que atreveram-se a estar alheias a
nós dois.

2 comentários:

  1. Letícia, além do bem escrever, o que intriga é a experiência de vida que testemunha (com tanta emoção), apesar de não ter idade para ter. Parabéns!

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  2. Leio e releio essa poesia e penso que sempre posso ler mais uma vez de tão bonito, sabe. Isso sim é a poesia que procuro para me acalmar...

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