segunda-feira, 15 de agosto de 2011

O segredo das estrelas

A noite vinha depressa, forçando o Sol a se esconder. Era ele um grande covarde, era o que pensava. Lembrava-se de que, quando menina, sempre dizia ao Sol, logo antes desse ir-se:
- Não vá, tolinho, não precisa ir. Não tenha medo do escuro, pois ele não pode fazer-lhe mal algum! Não confias em mim, Solzinho?
Mas ele sempre ia embora. E ela ficava sozinha, e com raiva e medo misturados no confuso coração.
Hoje, nesse fim de tarde gélido, ela via o Sol fugir mais uma vez. E mais uma vez ele a desapontava. Ela bufou, e virou levemente o rosto, como quem diz:
‘- Eu não acredito que confiei em você. Você, mais uma vez, me decepcionou. ’, assim como fazia toda tarde.
Mas aí, como em toda tarde, acontecia uma mágica. Quando o Sol já tocava a linha do horizonte, já louco para ir embora, parava de repente. Era como se, ao ver o que fazia com a menina, se sentisse muito culpado.
E, nessa hora, a menina quase flutuava de alegria. Porque era nessa hora que o Sol vencia um pouquinho a pressa e ficava um pouco mais. E, vendo como ela tremelicava, frágil, embalava-a com um espetáculo de cores que pintava metade do mundo. Cobria seus braços arrepiados com seus raios mais ternos, e abraçava-a com força até que ela soltasse um pequeno sorriso.
E ele sabia que ela o havia perdoado.
Daí, ele ficava tão feliz que brilhava mais, mais do que durante todo o dia e por um segundo a felicidade do Sol resplandecia em cada beijo, em cada passo, em cada lágrima que caía até onde ele alcançava. E o mundo sorria com ele.
E como ela ficava feliz! Ah, mas ela tinha também muita raiva. Porque seria tudo muito, muito mais fácil se ele não se despedisse assim. Ela iria simplesmente odiá-lo para sempre, e pronto.
Mas o Sol nunca ia embora sem se despedir, sem pedir perdão.
E, por mais que ela relutasse, que soubesse que seria assim de novo na tarde seguinte, bastava ele pintar o céu de todas as cores do mundo misturadas, irradiando-as em seus raios para cada cantinho que queria alcançar, e ela estava de novo apaixonada.
Aí, ele ia embora. E ela continuava ali, em seu banco de praça, sentada de olhos fechados, aspirando o restinho do calor de seu maior amante. E esperava a noite bem quietinha. Não importava se estava com frio, ou com medo. Porque pelo Sol, ela vencia o medo.
Mas também porque a despedida do Sol ficava ainda mais bonita seguida da noite. Porque a felicidade dele se espalhava e respingava no céu, e fazia as estrelas. E a menina ria, ria da inveja da lua e do amor do Sol.
E a menina entendia que o Sol também precisava dar luz às outras pessoas. Dar um pouquinho do seu calor a elas. Ele não ia embora de propósito, para magoá-la.
Mas ele sempre deixava um pouquinho dele com ela, para ela cuidar. E ela soube que ele a amava, e confiava nela, e queria que o mundo todo visse isso.
Nessa noite, ela olhou pro céu com força, tentando capturar com um só olhar todos os pedacinhos que o Sol deixou pra ela. Ficou assim por muito, muito tempo, apreciando a declaração secreta que ele a fizera.
E, em meio àquela noite sem nuvens, ela guardou mais uma vez aquele segredo. O segredo que o Sol só confiava a ela. O segredo das estrelas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário